Em Agosto de 2018 o IBOPE Repucom divulgou uma análise dos patrocínios de clubes dos principais países da América Latina. A pesquisa mostra que Argentina, Chile, Uruguai, Paraguai, Equador, Colômbia, México, Bolívia, Peru e Venezuela tem uma maior diversificação de patrocinadores de camisa, assim como a presença mais relevante de marcas globais quando comparado ao futebol brasileiro.
Objetivando auxiliar na resposta à questão levantada pela pesquisa (Por que não investem aqui?) buscamos localizar quais são os países em que as grandes marcas presentes no Brasil e na América Latina atuam como patrocinadores nos países latino-americanos, mas não no Brasil, como Mc Donald\’s, Coca-Cola, Pepsi, Samsung (entre muitas outras…), que tem um forte mercado no Brasil, mas não investem em patrocínio. Por outro lado, marcas citadas na pesquisa como AT&T, BBVA, DIRECTV (entre outras), não foram consideradas na pesquisa, pois afinal não atuam no Brasil.
Alguns casos específicos não foram considerados por esse estudo, como a Gatorade no Peru e a Chevrolet no Equador e no Chile. Isso porque a Chevrolet, até pouco tempo, tinha os Naming Rights do Campeonato Brasileiro e patrocinava a Seleção Brasileira de Futebol. A empresa só deixou de patrocinar a Seleção porque precisava \”readequar seus investimentos de marketing diante do cenário desafiador que vive a indústria automotiva no País\”, e a Gatorade que ,mesmo sendo considerado um valor pequeno, investe no futebol brasileiro (inclusive na Seleção, onde também faz campanhas para ativar a marca).
Inicialmente, percebemos que muitas empresas não são responsáveis pelo patrocínio master, ou seja, não são o patrocinador principal, do clube. Esse é o caso do futebol venezuelano, onde Pepsi e Mc Donald\’s não são os patrocinadores principais dos clubes em um país marcado pela instabilidade política e econômica nos últimos anos. O mesmo ocorre na Colômbia (com a Suzuki), no Paraguai (com Mc Donald’s, Coca-Cola e Rexona), no Uruguai (com a Nissan), no Peru (com a Kia), no Chile (com a Chery) e no Equador (com a Pepsi).
Alguns casos específicos, no entanto, chamam a atenção, como no Equador, onde o Barcelona de Guayaquil, maior time equatoriano, conta com 34 parceiros, entre patrocinadores e empresas de licenciamento, o que gera uma receita de 10 milhões de dólares (cerca de 38 milhões de reais). Trata-se de valor alto, que se aproxima ao que grandes clubes no Brasil recebem apenas de um único patrocinador principal, como é o caso do Flamengo, e de um valor consideravelmente menor do que o Palmeiras recebe. No Peru, onde o Alianza Lima, time mais tradicional peruano, está sem patrocinador máster – mesmo pedindo modestos 1,5 milhões de dólares (um pouco menos de 6 milhões de reais).
Nossos hermanos da Argentina contam com as empresas BBVA, Qatar Airways e Axe; patrocinadores não atuantes no Brasil. O BBVA não trabalha mais no Brasil, pois foi comprado pelo Bradesco em 2003. A empresa que era patrocinadora master de River Plate e Boca Juniors, deixou as equipes no meio do ano e não patrocina mais nenhum clube na Argentina. O River está sem patrocinador master, enquanto o Boca conseguiu um contrato, de cerca de 18 milhões de reais anuais, com a Qatar Airways. Já a Axe está presente tanto nos shorts do River quanto nos do Boca, por cerca de 1,2 milhões de dólares (aproximadamente 4,6 milhões de reais). Esses valores fazem o futebol argentino obter valores próximos aos brasileiros.
Por fim, vamos ao México. Para entender o número alto de patrocinadores, precisamos contextualizar. A liga mexicana é a segunda mais valiosa da América Latina, atrás apenas da brasileira e, o principal diferencial do México para um patrocinador, é a geografia. O fato do México fazer fronteira com os Estados Unidos atrai mais investidores ao país do que ao Brasil. E investidores atraem melhores jogadores e vice-versa, como é o caso do atacante francês Andre-Pierre Gignac, que em 2018 recusou proposta do Monaco para continuar no Tigres.
Agora, vamos à comparação de patrocínios. A Coca-Cola, apesar de apoiar diversos times mexicanos, está presente no uniforme apenas do Tigres e do Pumas, ambos na manga, e no Santos Laguna, no canto superior esquerdo do peito. A Bridgestone aparece discretamente nas meias do América. A Suzuki aparece na manga do Pumas, e a Herbalife nas costas, acima do número.
Sendo assim, o estudo de que empresas investem mais em outros clubes da América Latina, por ter seu nome em alguma parte do uniforme, não leva em consideração o contexto onde as marcas estão inseridas.
- Primeiro, por haver diversas quotas de patrocínio (master, costas, manga…).
- Segundo, por não podemos comparar países do porte do Brasil, México e Argentina à países como a Venezuela e Bolívia, que possuem quase nenhuma tradição no futebol mundial. Obviamente o investimento nesses países será bem inferior a países com mais tradição e poder econômico.
- ·Terceiro, porque algumas empresas podem ter mercado estratégico em determinados países. Seja por querer expandir vendas em determinado local, ou por estar recém chegando em outro.
- ·Quarto, porque muitas empresas citadas na pesquisa não atuam no mercado brasileiro.
- ·Quinto, porque, assim como existem empresas que não atuam no futebol brasileiro, o contrário também ocorre. Como é o caso da Uber, que patrocina times no Brasil e não patrocina nenhum outro time na América Latina (mesmo com o México sendo um de seus países favoritos).
Claro que não podemos considerar apenas a questão financeira de quanto um clube recebe por determinado parceiro, mas isso é um indicativo. As empresas têm que investir muito mais dinheiro para patrocinarem clubes brasileiros do que no resto da América Latina (com exceção da Argentina) e, soma-se a essa alta quantia de investimento, a crise que o Brasil tem enfrentado nos últimos anos. Além disso, muitas das empresas que foram citadas na pesquisa do IBOPE Repucom, já patrocinaram clubes brasileiros em um passado não tão distante. Como por exemplo, a KIA, que patrocinou o Palmeiras em 2012 e o emblemático caso da Coca-Cola que em 1987 patrocinava quase todos os times (15 das 24 equipes) da Copa União (campeonato brasileiro organizado pelo clube dos 13 na época) e a Seleção Brasileira, onde inclusive estampou a marca no uniforme em uma partida oficial (algo proibido pela FIFA nos dias de hoje). A Coca-Cola só parou de patrocinar a Seleção porque o então presidente Ricardo Teixeira rompeu unilateralmente com a empresa para assinar com a AMBEV. Em 2012, por causa disso, a Coca-Cola ganhou um processo contra a CBF de R$ 8 milhões.
No Brasil, a cultura do patrocínio esportivo ainda é muito restrita à exposição de marca, mas, na verdade, vai muito além disso. Então, a nova questão que fica é, o quanto vale a pena hoje, tanto financeiramente quanto em termos de propagação da marca, uma empresa investir uma quantia alta de dinheiro em clubes de futebol no Brasil? E tendo esse investimento, os clubes estão sendo capazes de dar o retorno esperado pelas empresas?
Por: Luis Felipe Rebello Damo – Consultor